Ronald Ridgeway "morreu" no Vietnã
em 25 de fevereiro de 1968.
O soldado raso dos marines tinha 18 anos de
idade e tombou com uma bala no ombro durante violenta troca de tiros com o
inimigo nos arredores da base avançada norte americana na provincia de Khe Sanh.
Dezenas de marines morreram ali nesse dia,
integrantes daquela que ficaria conhecida como a "patrulha fantasma".
A batalha em torno de Khe Sahn ocorreu durante o verão de 1967. Inicialmente o comando americano em Saigon acreditou tratar-se apenas de uma pequena ofensiva norte vietnamita, nas regiões fronteiriças, avaliação que logo mudou, quando o serviço secreto descobriu que o Exército do Povo do Vietnân - cuja sigla em inglês era NVA - movia suas forças para a região da base de combate em Khe Sahn, numa tenttiva de isolá-la das demais forças norte americanas e sul vietnamitas.
Durante 77 dias a Base de Combate de Khe Sah, conhecida pela sigla BCKS, e seus postos avançados foi mantida sob diuturnos ataques de morteiros, artilharia e foguetes pelo NVA, rechaçadas por sucessivos ataques da aviação norte americana, enquanto em terra sucediam-se desesperadas e violentas ações de combate entre as infantarias.
Somente em março de 1968, como o desencadeamento da "operação pegasus", executada por uma força-tarefa combinada de Fuzileiros Navais, Exército dos Estados Unidos e Exército do Vietnãn do Sul, o cerco a Khe Sahn pode ser rompido, após brutais combates em trincheiras, consolidando a vitória tática das forças norte americanas e sul vietnamitas.
A luta por Khe Sahn foi de tal ordem violenta que um marine norte americano fez questão de gravar a ponta de baioneta na porta de uma das latrinas uma frase que sintetiza todo o horror daquela luta: "quando eu morrer tenho certeza que vou direto para o céu, porque já tive o meu inferno em Khe Sahn".
Inicialmente Ridgeway foi dado como desaparecido em combate. No Texas , o colégio onde ele estudara, o Sam Houston High, anunciou seu desaparecimento pelo alto-falante.
Sua mãe, Mildred, recebeu uma carta de seu oficial comandante dizendo que havia pouca esperança de que ele tivesse sobrevivido. E em agosto daquele ano ela recebeu um telegrama dos Marines informando-a "com profundo pesar" da morte de seu filho.
A batalha em torno de Khe Sahn ocorreu durante o verão de 1967. Inicialmente o comando americano em Saigon acreditou tratar-se apenas de uma pequena ofensiva norte vietnamita, nas regiões fronteiriças, avaliação que logo mudou, quando o serviço secreto descobriu que o Exército do Povo do Vietnân - cuja sigla em inglês era NVA - movia suas forças para a região da base de combate em Khe Sahn, numa tenttiva de isolá-la das demais forças norte americanas e sul vietnamitas.
Durante 77 dias a Base de Combate de Khe Sah, conhecida pela sigla BCKS, e seus postos avançados foi mantida sob diuturnos ataques de morteiros, artilharia e foguetes pelo NVA, rechaçadas por sucessivos ataques da aviação norte americana, enquanto em terra sucediam-se desesperadas e violentas ações de combate entre as infantarias.
Somente em março de 1968, como o desencadeamento da "operação pegasus", executada por uma força-tarefa combinada de Fuzileiros Navais, Exército dos Estados Unidos e Exército do Vietnãn do Sul, o cerco a Khe Sahn pode ser rompido, após brutais combates em trincheiras, consolidando a vitória tática das forças norte americanas e sul vietnamitas.
A luta por Khe Sahn foi de tal ordem violenta que um marine norte americano fez questão de gravar a ponta de baioneta na porta de uma das latrinas uma frase que sintetiza todo o horror daquela luta: "quando eu morrer tenho certeza que vou direto para o céu, porque já tive o meu inferno em Khe Sahn".
Sua mãe, Mildred, recebeu uma carta de seu oficial comandante dizendo que havia pouca esperança de que ele tivesse sobrevivido. E em agosto daquele ano ela recebeu um telegrama dos Marines informando-a "com profundo pesar" da morte de seu filho.
Mas, enquanto seus companheiros e familiares choravam sua morte, Ron Ridgeway passou cinco anos em inóspitas prisões norte-vietnamitas, com frequência em solitária, travando guerra mental com seus captores e lutando para conservar uma vida que oficialmente já havia acabado.
No mês passado, quase 50 anos após sua morte suposta,
Ridgeway, que hoje tem 68 anos e se aposentou como supervisor do Departamento
de Assuntos de Veteranos, sentado em sua casa em Hallettsville, contou em
detalhes, pela primeira vez, uma das histórias mais notáveis da Guerra do
Vietnã.
No momento em que os EUA comemoram meio século
passado desde o auge da guerra, em 1967 e 1968, sua saga de alguém que
"voltou do mundo dos mortos" é a história da perseverança de um jovem
que passou por combate armado, detenção e maus-tratos.
Ron Ridgeway tinha 17 anos quando se alistou
nos Marines, em 1967. Tinha 18 quando foi capturado, 19 quando seu funeral foi
realizado e 23 quando foi libertado da prisão, em 1973.
"Você tem que levar a vida um dia de cada
vez", ele disse. "Tem que colocar na cabeça que vai sobreviver. Tem
que acreditar que eles não vão derrotá-lo, que você vai vencer."
Às 9h30 da manhã de 25 de fevereiro de 1968, a esquadra de quatro
homens da qual Ridgeway fazia parte atacou uma trincheira do inimigo.
A trincheira curva parecia estar vazia. Mas,
quando Ridgeway e seus companheiros abriram caminho nela, de repente uma
granada inimiga foi jogada dentro.
"Recuamos pela curva", ele contou. "A granada explodiu. Nós jogamos algumas granadas. Recuamos mais um pouco. Então percebemos que os disparos dos Marines atrás de nós tinham diminuído, quase sumido."
Quando eles se levantaram para olhar para
trás, viram soldados norte-vietnamitas caminhando em sua direção no meio da
vegetação rasteira. "Acho que eles pensavam que tínhamos morrido
todos", disse Ridgeway.
"Mandamos ver, atirando contra eles com tudo. Eles eram alvos fáceis."
Ridgeway tinha sido parte de um pelotão de 45
homens enviados da base de combates de Khe Sanh, no então Vietnã do Sul, que
estava cercada pelo inimigo, para localizar posições inimigas e possivelmente
capturar um prisioneiro.
O inimigo vinha apertando o cerco em volta da
base de marines, com fogo pesado de morteiros e artilharia, e a missão da
patrulha era arriscada. Seis mil militares americanos estavam cercados por
entre 20 mil e 40 mil soldados norte-vietnamitas.
Naquela manhã de neblina, o líder da patrulha,
segundo tenente Donald Jacques, de 20 anos, se desviou do caminho traçado e foi
atraído para uma emboscada fatal. A informação é do comandante da companhia de
Jacques, capitão Kenneth Pipes.
Mais de 24 marines foram mortos, incluindo
Jacques.
Um dos marines que estava na trincheira com
Ridgeway, James Bruder, 18 anos, de Allentown, Pensilvânia, foi abatido quando
o inimigo abriu fogo, segundo o livro do escritor Ray Stubbe sobre Khe Sanh,
"Battalion of Kings".
"Os tiros costuraram o peito dele e o
mataram", Ridgeway recorda.
O líder da esquadra, Charles Geller, 20 anos,
de East St. Louis, Illinois, arriscou uma olhada rápida. Uma bala passou por
sua testa de raspão, jogando-o ao chão.
"Todo o mundo morreu", disse Geller, segundo o livro de Stubbe. "Todo o mundo atrás de nós morreu. O que vamos fazer?"
Eles tinham que recuar. Geller foi o primeiro
a sair da trincheira. Ele atravessou correndo o campo pelo qual haviam atacado,
seguido por Ridgeway.
Ele e Geller correram em retirada e se
depararam com Willie Ruff, 20 anos, de Columbia, Carolina do Sul, que estava
deitado de costas com um braço quebrado.
"Estávamos com pressa", disse
Ridgeway. "Mas paramos. Ele estava ferido."
Quando Geller se ajoelhou ao lado de Ruff, uma
bala o atingiu no rosto, deixando um ferimento terrível. Então Ridgeway foi
atingido por um projétil que penetrou em seu ombro e saiu do outro lado. Agora
os três homens estavam no chão.
"Nossa única opção era ficarmos deitados lá e nos fingirmos de mortos", disse Ridgeway. "Estávamos bem no meio do campo para qualquer um ver."
Ridgeway disse que ficou alternando entre
momentos desmaiado e outros consciente. Quando Geller, que estava delirando, se
colocou de joelhos, o inimigo jogou uma granada, matando-o.
Em seguida, disse Ridgeway, os
norte-vietnamitas começaram a atirar nos marines tombados diante de suas
trincheiras. "Ficaram atirando nos corpos para garantir que todos
morressem", ele contou.
Uma bala atingiu o chão ao seu lado. Uma
segunda ricocheteou de seu capacete e o atingiu na nádega.
"Quando aquela bala me atingiu, meu corpo
estremeceu e eles acharam que tinham me liquidado. Me deram por morto e
passaram adiante."
Ridgeway desmaiou novamente. Quando acordou,
já era escuro e a artilharia americana estava atacando a área com força.
Ruff disse que tinha sido baleado de novo e
implorou a Ridgeway para não abandoná-lo. Ridgeway disse que não o deixaria.
Ruff morreu durante a noite.
Ridgeway foi despertado na manhã seguinte com
alguém puxando seu braço. Pensou, em um primeiro momento, que fossem seus
companheiros marines.
Mas, quando olhou para cima, percebeu que era um jovem soldado norte-vietnamita que estava tentando arrancar o relógio de seu pulso.
Após o tiroteio, os sobreviventes arrasados da
patrulha conseguiram retornar à base de combate, e os mortos foram deixados no
campo de batalha.
A ideia de uma missão para resgatar os corpos
foi considerada pouco prudente pelos comandantes superiores, que temiam perder
ainda mais homens e enfraquecer as defesas da base, segundo Kenneth Pipes, hoje
aposentado e vivendo na Califórnia.
Em entrevista telefônica, ele disse que, com
binóculos, conseguia enxergar os corpos dos marines espalhados pelo campo de
batalha. "Era pior que uma agonia", comentou. Não foram autorizadas
mais patrulhas fora da base de combates.
"Não podíamos ir lá buscar os
corpos", disse Pipes. "Ficaram jogados ali por seis semanas."
Em 17 de março ele escreveu à mãe de Ridgeway: "Sinto muito lhe dizer que não posso oferecer nenhuma base concreta para esperar que Ronald esteja vivo".
Em 17 de março ele escreveu à mãe de Ridgeway: "Sinto muito lhe dizer que não posso oferecer nenhuma base concreta para esperar que Ronald esteja vivo".
O que restara dos mortos foi levado de volta
ao mortuário temporário de Khe Sangh, onde Pipes e os outros se encarregaram da
tarefa tenebrosa de identificar os mortos. "Não havia muita coisa exceto
ossos, calçados, botas e "dog tags" (chapinhas de identificação
usadas por militares)", contou Pipes.
No final, segundo ele e Stubbe, dos 26
desaparecidos e presumivelmente mortos em combate em 25 de fevereiro, foram
identificados positivamente os restos mortais de todos menos nove.
Os restos mortais avulsos e não identificados
foram enviados para casa e colocados em dois caixões que seriam sepultados sob
uma grande lápide com os nomes dos nove desaparecidos cujos restos não tinham
sido identificados.
O dia do funeral no Cemitério Nacional do
Quartel Jefferson estava ensolarado e fresco. A mãe de Ronald Ridgeway assistiu
à cerimônia. Houve bandeiras nacionais e homenagens solenes. Um fotógrafo de
jornal fez fotos.
Lá longe, no Vietnã, a estação das chuvas já
tinha começado e Ron Ridgeway vivia seu sétimo mês como prisioneiro de guerra.
Sentado sozinho em sua cela sem janelas, ao
lado de um catre de madeira e do balde que usava para suas necessidades
fisiológicas, Ridgeway começou a criar uma vida de faz de conta.
Não havia ninguém com quem conversar. Só o
deixavam sair da cela uma vez por dia, para esvaziar o balde.
Então ele imaginava que estava em outro lugar,
que tinha mulher e filhos, que tinha uma picape e que ia sair para pescar.
Era um exercício mental, contou Ridgeway. Três dias vividos em seu mundo de faz de conta ocupavam um dia inteiro de sua vida na solitária.
Seus captores o viam como "reacionário
convicto" e consideravam todos os marines "animais".
Ridgeway não havia cooperado com os guardas.
Ele tinha mentido para os interrogadores, dado informações falsas e feito de
conta que era um rapaz inexperiente que nunca tinha disparado seu fuzil.
Naquela manhã, ao perceber que Ridgeway ainda
estava vivo, o soldado norte-vietnamita se espantou e carregou seu fuzil.
Ridgeway pensou que seria morto. "Nunca
se ouvia falar que eles fizessem prisioneiros", explicou. Mas colocaram
curativos em seus ferimentos, o alimentaram e o levaram embora, atravessando o
Laos e o Vietnã do Norte em marcha forçada.
Ridgeway passou tempo em vários acampamentos
na selva. Foi colocado em uma espécie de tronco de madeira que prendia suas
pernas. Acabou sendo encarcerado em prisões do inimigo.
Ele pegou piolhos, contraiu malária, teve
disenteria e perdeu 25 quilos. Usava uniforme listrado de prisioneiro de
guerra, uma espécie de pijama rosa e preto, e sandálias de borracha. Levou tudo
isso com ele quando foi libertado.
Durante os interrogatórios, ele era amarrado e
espancado com varas de bambu.
Um dos interrogadores era especialmente cruel.
Os americanos o apelidaram de "Cheese", porque ele parecia ser o
"big cheese", ou grande chefão.
Ele falava inglês e ficava sentado sobre uma cadeira alta quanto interrogava os prisioneiros de guerra deitados no chão, amarrados. Quando fazia um gesto com a cabeça, um guarda batia no prisioneiro com a vara de bambu.
Ridgeway disse que não ficava pensando no fato
de que, em casa, as pessoas provavelmente pensavam que ele estivesse morto.
Pensava que as pessoas deviam estar bem. Ele tinha uma tarefa a cumprir:
continuar vivo.
Em janeiro de 1973, ele estava no notório
presídio norte-vietnamita conhecido como o Hilton de Hanói quando seus captores
anunciaram de repente que os prisioneiros de guerra seriam libertados como
parte de um acordo de paz, antes da retirada das forças americanas do Vietnã.
Quando foi divulgada a lista dos prisioneiros
que seriam libertados, o nome de Ron Ridgeway estava nela.
Em Houston, sua mãe bateu na porte de uma
vizinha para lhe dizer: "Ronnie está vivo!"
"Voltei basicamente inteiro", ele
disse. "Voltei capaz de viver minha vida. Fomos para lá com uma tarefa a
cumprir. Cumprimos a tarefa da melhor maneira que pudemos. Tivemos a sorte de
retornar."
Vários meses após seu retorno, ele e sua
mulher, Marie, foram ao quartel de Jefferson para ver sua lápide, que foi substituída
mais tarde.
"Aquilo me trouxe muitas memórias",
ele contou. "As mortes de pessoas que eu conhecia. Foi uma experiência
solene."
A lápide trazia gravadas as palavras "Patrulha morta em emboscada no Vietnã em 25 de fevereiro de 1968".
Havia oito nomes. O primeiro da lista era
Ronald L. Ridgeway.
Folha de SP - The Washington Post
Com colaboração de Magda Jean-Louis.
Tradução de Clara Alainainin